segunda-feira, 28 de agosto de 2017

Elbphilharmonie x Cineteatro Capitólio

Hamburgo tem uma nova sala de ópera e isso é um dos argumentos que servem a Luís Naves para, num post do Delito de Opinião, ridicularizar o ranking das cidades europeias no domínio da cultura e da criatividade que coloca Lisboa à frente da Cidade Hanseática.
A capital lusa, pelo seu lado, vai reabrir uma das antigas salas do Parque Meyer, consagrando-a a «música*, humor e cinema».
Ninguém estava (infelizmente) à espera que no Parque Meyer se abrisse uma sala de ópera, tanto mais que a exploração do espaço em causa, o Cineteatro Capitólio, foi posta a concurso. Só em sonhos mais delirantes do que os do ranking produzido pela União Europeia um espaço posto a concurso para exploração privada teria como vencedor um projecto dedicado à música clássica. Assim em Portugal como decerto em Hamburgo.
A nova ópera alemã — presumo que Luís Naves se refira à Elbphilharmonie — custou, à boa maneira portuguesa, quatro ou cinco vezes mais do que as primeiras estimativas, sofreu atrasos embaraçosos e a sua exploração, hélas!, não foi entregue a privados. É que, ainda que certamente haja na Alemanha mais amantes de ópera do que em Portugal e a melomania privada tenha ali mais recursos do que na ocidental praia lusitana, a ópera é um prazer caro e não rentável.
Civilizada, culta e rica, a Alemanha não deixa, naturalmente, que considerações sobre os gastos públicos** privem uma cidade de uma nova ópera.
Em Lisboa, contudo, orçamentos municipais mais apertados estimulam outras soluções. Confia-se que empresas privadas consigam dinamizar uma sala de espectáculos da cidade — sem encargos para a Câmara, com proveito para os munícipes e, fazem-se decerto figas, sem prejuízo para o concessionário.
Não se pode censurar a vencedora Sons em Trânsito por propor «música, humor e cinema» para o Capitólio. E nem é justo acusá-la de oportunismo por utilizar como referência a localização e o patrono do espaço (Raul Solnado) para balizar preventivamente o «humor» que o Cineteatro acolherá. Os restantes candidatados não tinham como apresentar proposta essencialmente diferente — e programações culturais mais abrangentes e diversas, que incluam música clássica, dança e teatro, não são privatizáveis. Nem em Lisboa nem em Hamburgo. As cidades que se querem afirmar por esta via “culta” ou têm a sorte de ter no seu território teatros financiados pelo Estado Central ou reservam verbas no orçamento municipal. Não há outro caminho: os apoios de empresas nacionais dão, no máximo, para mais um redundante festival de Verão.


* Sobretudo pop/rock, naturalmente.
** Mesmo que auxiliados por investimento privado na parte comercial do projecto.

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